Para ouvir lendo (ou apenas ouvir): Lucky (parte 01)
A intensa vontade de não ser miserável: recortes de um caderno de memórias*
08 de fevereiro
mesmo quando não chove, chove em mim.
mesmo quando abre o sol tem um cantinho que continua escuro e úmido;
a nhaca deve ser um viveiro de musgo.
14 de fevereiro
comigo carrego essa sensação que vez ou outra vem à tona, parece que sou capaz de sentir coisas que, além de não florescer, fazem regredir: mágoas, tristezas, lamentos, e, quando tudo junto, desolação. ódio? esse pareço não sentir, não, nem ele, nem nada assim que propulsione. parece que só na dor me reconheço e só na dor consigo reconhecer o resto que se há por aí. talvez aquela ladainha de só conseguir conhecer e ser conhecido por alguém, se este alguém carregar em si uma tristeza tão genuína e plena quanto a minha, seja mais verdade do que eu supunha na época em que comecei a pensar nisso tudo. hoje, embora pareça verdade, nem sei se eu iria querer isso mesmo, conhecer alguém na tristeza e nela também me reconhecer, porque, poxa, eu quero é ser feliz, mesmo que, talvez, não faça nem ideia de como isso funcione. Se bem que deve ser bom não saber ser feliz, quase como um pré-requisito, para assim conseguir ser e se sentir, sem a inútil teorização das metafísicas intangíveis e todo esse caralho a quatro todo que nesses casos não servem de nada.
16 de fevereiro
eu quero amor, quero lutar contra o sono e vencer, eu quero ver o dia nascer no meio de uma conversa acalorada, eu quero ver o dia nascer enquanto divido um silêncio ainda mais acalorado e íntimo com alguém, não quero dormir mais para que o hoje nunca acabe, quero dormir cedo para que o tão esperado amanhã chegue logo, quero sonhos, quero sonhar que posso voar, quero realizações, quero delírios, quero experimentar todo tipo de exaustão, quero paz de espírito, coração apertado, mente em movimento, quero uma inspiração e por alguma coisa, quero ajudar no que puder, mesmo que não consiga, quero tentar, quero fazer a diferença para aquele que está imediatamente próximo a mim, quero me abalar com o atroz, quero estudar, aprender, ensinar, quero uma vida que eu reconheça como minha.
quero beijos intermináveis até que os olhos mudem de cor, brincadeirinha, mas é sério, quero emocionar alguém, quero me emocionar com alguém, quero querer alguém, quero frio na barriga, pelos arrepiados, dar prazer, ser o motivo de algum sorriso, quero ser uma boa, singela e simples companhia, quero acalantar todas as dores físicas e mentais, minhas ou não, que puder, quero deixar a minha marca e quero que ela seja boa, quero ser um bom contador de histórias, quero ser um amigo sempre melhor, quero sinceridade, quero ser mais e mais sincero, quero despedidas, encontros e reencontros, ser para e através do outro, quero uma vida em que eu me reconheça, virtudes e vícios, e ainda que exista o eterno querer mais eu me dê por satisfeito apenas por estar nessa.
20 de fevereiro
no fundo, a gente só quer ter em quem pensar quando a letra diz: how I whish, how I wish you were here...
---
* Excerto do meu conto de mesmo nome publicado no livro “No arco-íris do esquecimento” (2012, Ed. Multifoco). Que pode ser adquirido em:
Livro: http://www.editoramultifoco.com.br/literatura-loja-detalhe.php?idLivro=966&idProduto=995
João Henrique Balbinot, paranaense de interior, gosta de viver rodeado de músicas, palavras e pessoas. Quase sempre.
Blog: http://influir.wordpress.com/
Facebook: http://www.facebook.com/jh.balbinot
Last.fm: http://www.lastfm.com.br/user/joaohenriquebf